terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

O que é comida de verdade - a classificação dos alimentos pela distancia da natureza

SOB UMA VISÃO TÉCNICA - O QUE É COMIDA DE VERDADE?

Recomendações nutricionais que orientam práticas da alimentação do dia a dia envolvem o reconhecimento dos alimentos que precisam ou podem ser consumidos. Muitas vezes falamos na utilização da "comida de verdade". Essa expressão muitas vezes parece imprecisa para a maioria das pessoas, pois num primeiro momento, tudo que é vendido num supermercado deveria ser "comida" se esse é o atributo de um produto (alimentício) numa prateleira.
No entanto a comida de verdade diz respeito ao alimento disponível em ambientes naturais, despojado de embalagens, rótulos com lista de nutrientes, ou aditivos químicos de nome incomprensível para a maioria das pessoas. Contudo, a maioria de nós mora em um ambiente urbano, e poucos têm contato com locais de produção primária como sítios, hortas, pomares ou estábulos. Então uma boa parcela de alimentos "brutos" vão passar por algum tipo de manejo para ficar disponível ao consumidor da cidade, como embalamentos, lavagens, refrigeração etc. Ainda assim poderão ser tão próximos quanto possível do alimento in natura.
Em 2010 um grupo de pesquisadores em nutrição, da USP, liderados pelo professor Carlos Monteiro, criou uma classificação alimentar, que foi chamada de NOVA. Essa classificação agrupa os alimentos de acordo com a distância que eles apresentam em relação ao estado original. É a base do Guia Alimentar para a População Brasileira de 2014.
É também essa classificação que trouxe à tona o termo Alimento Ultraprocessado - ou UPF (ultra processed food, em inglês). E o guia alimentar recomenda: evite os ultraprocessados. Conheça a seguir essa classificação. Essa compilação foi extraida do World Nutrition Journal (uma publicação do World Public Health Nutrition Association)

Numa próxima publicação examinaremos um artigo que examina como os alimentos ultraprocessados assumiram um papel tão expressiva no consumo alimentar cotidiano e quais as graves consequencias dessa mudança de hábitos para a saúde pública.


GRUPO 1


  Grupo 1
  Alimentos in natura ou minimamente processados

   O primeiro grupo da classificação NOVA inclui alimentos in natura e alimentos minimamente processados. Alimentos in natura são partes comestíveis de plantas (sementes, frutos, folhas, caules, raízes) ou de animais (músculos, vísceras, ovos, leite) e também cogumelos e algas e a água logo após sua separação da natureza. 

   Alimentos minimamente processados são alimentos in natura submetidos a processos como remoção de partes não comestíveis ou não desejadas dos alimentos, secagem, desidratação, trituração ou moagem, fracionamento, torra, cocção apenas com água, pasteurização, refrigeração ou congelamento, acondicionamento em embalagens, empacotamento a vácuo, fermentação não alcoólica e outros processos que não envolvem a adição de substâncias como sal, açúcar, óleos ou gorduras ao alimento in natura. 

   O principal propósito do processamento empregado na produção de alimentos do grupo 1 é aumentar a duração dos alimentos in natura permitindo a sua estocagem por mais tempo. Outros propósitos incluem facilitar ou diversificar a preparação culinária dos alimentos (como na remoção de partes não comestíveis, fracionamento e trituração ou moagem dos alimentos) ou modificar o seu sabor (como na torra de grãos de café ou de folhas de chá e na fermentação do leite para produção de iogurtes). 

   São exemplos típicos de alimentos do grupo 1: legumes, verduras, frutas, batata, mandioca e outras raízes e tubérculos in natura ou embalados, fracionados, refrigerados ou congelados; arroz branco, integral ou parboilizado, a granel ou embalado; milho em grão ou na espiga, grãos de trigo e de outros cereais; feijão de todas as cores, lentilhas, grão de bico e outras leguminosas; cogumelos frescos ou secos; frutas secas, sucos de frutas e sucos de frutas pasteurizados e sem adição de açúcar ou outras substâncias ou aditivos; castanhas, nozes, amendoim e outras oleaginosas sem sal ou açúcar; cravo, canela, especiarias em geral e ervas frescas ou secas; farinhas de mandioca, de milho ou de trigo e macarrão ou massas frescas ou secas feitas com essas farinhas e água; carnes de boi, de porco e de aves e pescados frescos, resfriados ou congelados; frutos do mar, resfriados ou congelados; leite pasteurizado ou em pó, iogurte (sem adição de açúcar ou outra substância); ovos; chá, café e água potável.

   São também classificados no grupo 1 itens de consumo alimentar compostos por dois ou mais alimentos deste grupo (como granola de cereais, nozes e frutas secas, desde que não adicionada de açúcar, mel, óleo, gorduras ou qualquer outra substância) e alimentos deste grupo enriquecidos com vitaminas e minerais, em geral com o propósito de repor nutrientes perdidos durante o processamento do alimento in natura (como a farinha de trigo ou de milho enriquecida com ferro e ácido fólico). 

   Embora pouco frequentes, alimentos do grupo 1 quando adicionados de aditivos que preservam as propriedades originais do alimento, como antioxidantes usados em frutas desidratadas ou legumes cozidos e embalados a vácuo, e estabilizantes usados em leite ultrapasteurizado permanecem classificados no grupo 1. 


GRUPO 2


  Grupo 2
  Ingredientes culinários processados
  
   O segundo grupo da classificação NOVA é o de ingredientes culinários processados. Este grupo inclui substâncias extraídas diretamente de alimentos do grupo 1 ou da natureza e consumidas como itens de preparações culinárias. Os processos envolvidos com a extração dessas substâncias incluem prensagem, moagem, pulverização, secagem e refino. 

   O propósito do processamento neste caso é a criação de produtos que são usados nas cozinhas das casas ou de restaurantes para temperar e cozinhar alimentos do grupo 1 e para com eles preparar pratos salgados e doces, sopas, saladas, conservas, pães caseiros, sobremesas, bebidas e preparações culinárias em geral. 

   As substâncias pertencentes ao grupo 2 apenas raramente são consumidas na ausência de alimentos do grupo 1. São exemplos dessas substâncias: sal de cozinha extraído de minas ou da água do mar; açúcar, melado e rapadura extraídos da cana de açúcar ou da beterraba; mel extraído de favos de colmeias; óleos e gorduras extraídos de alimentos de origem vegetal ou animal (como azeite da oliva, manteiga, creme de leite e banha), amido extraído do milho ou de outra planta.

   São também classificados no grupo 2 produtos compostos por duas substâncias pertencentes ao grupo (como manteiga com sal) e produtos compostos por substâncias deste grupo adicionadas de vitaminas ou minerais (como o sal iodado). Vinagres obtidos pela fermentação acética do álcool de vinhos e de outras bebidas alcoólicas também são classificados no grupo 2, neste caso pela semelhança de uso com outras substâncias pertencentes ao grupo. 

   Produtos do grupo 2 quando adicionados de aditivos para preservar suas propriedades originais, como antioxidantes usados em óleos vegetais e antiumectantes usados no sal de cozinha, ou de aditivos que evitam a proliferação de micro-organismos, como conservantes usados no vinagre, permanecem classificados no grupo 2. 



GRUPO 3



 Grupo 3
 Alimentos processados

   O terceiro grupo da classificação NOVA é o de alimentos processados. Este grupo inclui produtos fabricados com a adição de sal ou açúcar, e eventualmente óleo, vinagre ou outra substância do grupo 2, a um alimento do grupo 1, sendo em sua maioria produtos com dois ou três ingredientes. Os processos envolvidos com a fabricação desses produtos podem envolver vários métodos de preservação e cocção e, no caso de queijos e de pães, a fermentação não alcoólica. 

   O propósito do processamento subjacente à fabricação de alimentos processados é aumentar a duração de alimentos in natura ou minimamente processados ou modificar seu sabor, portanto semelhante ao propósito do processamento empregado na fabricação de alimentos do grupo 1. 

   São exemplos típicos de alimentos processados: conservas de hortaliças, de cereais ou de leguminosas, castanhas adicionadas de sal ou açúcar, carnes salgadas, peixe conservado em óleo ou água e sal, frutas em calda, queijos e pães. 

   Produtos do grupo 3 quando adicionados de aditivos para preservar suas propriedades originais, como antioxidantes usados em geleias, ou para evitar a proliferação de micro-organismos, como conservantes usados em carnes desidratadas, permanecem classificados no grupo 3.  

   Caso bebidas alcoólicas sejam consideradas como parte da alimentação, aquelas fabricadas pela fermentação alcoólica de alimentos do grupo 1, como vinho, cerveja e cidra, são classificadas no grupo 3 da classificação NOVA. 


GRUPO 4

 Grupo  4
 Alimentos ultraprocessados
  
   O quarto grupo da classificação NOVA é o de alimentos ultraprocessados. Este grupo é constituído por formulações industriais feitas tipicamente com cinco ou mais ingredientes. Com frequência, esses ingredientes incluem substâncias e aditivos usados na fabricação de alimentos processados como açúcar, óleos, gorduras e sal, além de antioxidantes, estabilizantes e conservantes.
Ingredientes apenas encontrados em alimentos ultraprocessados incluem substâncias não usuais em preparações culinárias e aditivos cuja função é simular atributos sensoriais de alimentos do grupo 1 ou de preparações culinárias desses alimentos ou, ainda, ocultar atributos sensoriais indesejáveis no produto final. Alimentos do grupo 1 representam proporção reduzida ou sequer estão presentes na lista de ingredientes de produtos ultraprocessados.

   Substâncias apenas encontradas em alimentos ultraprocessados incluem algumas extraídas diretamente de alimentos, como caseína, lactose, soro de leite e glúten, e muitas derivadas do processamento adicional de constituintes de alimentos do grupo 1, como óleos hidrogenados ou interestereficados, hidrolisados proteicos, isolado proteico de soja, maltodextrina, açúcar invertido e xarope de milho com alto conteúdo em frutose. Classes de aditivos apenas encontrados em alimentos ultraprocessados incluem corantes, estabilizantes de cor, aromas, intensificadores de aromas, saborizantes, realçadores de sabor, edulcorantes artificiais, agentes de carbonatação, agentes de firmeza, agentes de massa, antiaglomerantes, espumantes, antiespumantes, glaceantes, emulsificantes, sequestrantes e umectantes.
 
   Vários processos industriais que não possuem equivalentes domésticos são usados na fabricação de alimentos ultraprocessados, como extrusão e moldagem e pré-processamento por fritura. 
   O principal propósito do ultraprocessamento é o de criar produtos industriais prontos para comer, para beber ou para aquecer que sejam capazes de substituir tanto alimentos não processados ou minimamente processados que são naturalmente prontos para consumo, como frutas e castanhas, leite e água, quanto pratos, bebidas, sobremesas e preparações culinárias em geral. Hiper-palatabilidade, embalagens sofisticadas e atrativas, publicidade agressiva dirigida particularmente a crianças e adolescentes, alegações de saúde, alta lucratividade e controle por corporações transnacionais são atributos comuns de alimentos ultraprocessados. 

   Exemplos de típicos alimentos ultraprocessados são: refrigerantes e pós para refrescos;
‘salgadinhos de pacote’; sorvetes, chocolates, balas e guloseimas em geral; pães de forma, de hotdog ou de hambúrguer; pães doces, biscoitos, bolos e misturas para bolo; ‘cereais matinais’ e ‘barras de cereal’; bebidas ‘energéticas’, achocolatados e bebidas com sabor de frutas; caldos liofilizados com sabor de carne, de frango ou de legumes; maioneses e outros molhos prontos; fórmulas infantis e de seguimento e outros produtos para bebês; produtos liofilizados para emagrecer e substitutos de refeições; e vários produtos congelados prontos para aquecer incluindo tortas, pratos de massa e pizzas pré-preparadas; extratos de carne de frango ou de peixe empanados do tipo nuggets, salsicha, hambúrguer e outros produtos de carne reconstituída, e sopas, macarrão e sobremesas ‘instantâneos’. 

   Embora pouco frequentes, são também classificados no grupo 4 produtos compostos apenas por alimentos do grupo 1 ou do grupo 3 quando esses produtos contiverem aditivos com função de modificar cor, odor, sabor ou textura do produto final como iogurte natural com edulcorante artificial e pães com emulsificantes.  

   Caso bebidas alcoólicas sejam consideradas parte da alimentação, aquelas fabricadas por fermentação de alimentos do grupo 1 seguida da destilação do mosto alcoólico, como cachaça,     uísque, vodca e rum, são classificadas no grupo 4 da classificação NOVA.


Nota - de acordo com o Novo Guia de Alimentação Brasileiro: 
EVITE OS ALIMENTOS ULTRAPROCESSADOS: Devido a seus ingredientes, alimentos ultraprocessados – como biscoitos recheados, ‘salgadinhos   de pacote’, refrigerantes e ‘macarrão instantâneo’ – são nutricionalmente desbalanceados. Por conta de sua formulação e apresentação, tendem a ser consumidos em excesso e a substituir alimentos in natura ou minimamente processados. Suas formas de produção, distribuição, comercialização e consumo afetam de modo desfavorável a cultura, a vida social e o meio ambiente.



Link do texto original - texto original em inglês com referências AQUI

NT Obs.: No texto original, no grupo 2 estão incluídos os óleos de sementes como da soja. Como os produtos industrializados a partir de soja e outros óleos vegetais estão associados a questões de saúde, pelo excesso de ômega-6 ou processamento industrial daninho, foi retirado da tabela acima. Nas orientações de uma dieta de baixo carboidrato esses óleos e seus derivados como a margarina são fortemente desaconselhados. A recomendação da redução do consumo de amidos também faz parte das recomendações de uma alimentação low carb. Obviamente essa classificação não tem preocupação com esse tipo de cuidado. Ainda assim é altamente relevante pois o consumo de artigos UPF pode estar na raiz de uma série de problemas de saúde da atualidade.  





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