domingo, 16 de fevereiro de 2014

Gorduras Alimentares e Saúde - Parte I




Gorduras alimentares e saúde: 
Recomendações dietéticas no contexto da evidencia científica
(Parte I)

Glen D Lawrence, do departamento de Química e Bioquímica da Long Island University, NY, publicou uma interessante revisão sobre as gorduras na alimentação para a revista Advances in Nutrition, da Sociedade Americana para Nutrição, em maio de 2013.
Current Issue CoverTrago esse artigo para o blog, pois ele se encaixa precisamente na perspectiva da lipidofobia que é o nosso tema central.  É muito curioso perceber que esse tipo de artigo científico não ganha qualquer manchete, seja nos órgãos de comunicação habituais, e nem mesmo naqueles veículos que pretensamente se acham de vanguarda, seja na internet ou em material impresso (alguns até parecem mais tendenciosos do que o desejável).
Bem, o autor faz uma ampla revisão baseada nos mais novos conhecimentos de fisiologia dos lipídios e do conhecimento atual sobre os mecanismos envolvidos com a formação da aterosclerose, com ênfase na doença cardiovascular. O artigo tem mais 130 referencias, e está repleto de termos técnicos, com nomes de personagens que provavelmente a maioria das pessoas, mesmo na área médico-nutricional, desconhecem.
Começa lembrando que o tema do colesterol como aspecto central das preocupações com a doença cardíaca se alicerça basicamente a partir da Pesquisa de Framingham (meados da década de 1950). Mas foi somente nos anos 90 que o mecanismo de regulação do colesterol e das lipoproteínas foi elucidado, quando veio à público, por exemplo, a questão do tamanho das partículas de colesterol, como um aspecto que estava associado a doença cardiovascular. O autor cita que as partículas LDL (habitualmente chamada, de forma simplística, de  colesterol ruim), pequenas e densas estão geralmente associadas a um aumento de triglicerídeos, obesidade abdominal, resistência à insulina e outros distúrbios metabólicos (chamamos de Síndrome Metabólica) que levam a disfunções na camada interna das artérias (endotélio) e suscetibilidade à trombose. Essa pequenas partículas LDL estão mais susceptíveis ao processo que chamamos de peroxidação lipídica, um fator para a doença arterial.
O autor cita vários aspectos da questão inflamatória associados a doença cardiovascular. Por exemplo: existe uma enzima chamada PON1, cuja inibição está relacionada à doença cardíaca, mas enquanto as gorduras saturadas não tem ação sobre essa enzima, os ácidos graxos mono e poliinsaturados parecem INIBIR sua ação enzimática.
O ácido linoleico (conhecido como ômega-6) faz as partículas LDL ficarem mais susceptíveis à peroxidação. Com isso ocorre subsequente depósito de LDL oxidado nas células chamadas de macrófagos que ficam na camada íntima das artérias. Um processo severo de peroxidação de gorduras ativa a transformação de um tipo de glóbulo branco circulante – os monócitos – para a forma de macrófagos que se transformariam nas Foam Cells (ou Células Espumosas, células que armazenam lipídeos) O processo de peroxidação também sinaliza para que a camada íntima das artérias encapsular essas células, envolvendo-as com matriz proteica extracelular, e eventualmente promovendo a calcificação. Uma grande abundância de ácido graxos poliinsaturados, em relação com monoinsaturados e saturados poderia provocar a aterogênese.
Agora o mais interessante: como os ácidos graxos saturados (gordura saturada) NÃO são suscetíveis à peroxidação lipídica eles NÃO estão envolvidos com todos os mecanismos ligados a formação da placa característica da aterosclerose. Isso traz à tona como a questão de como os ácidos graxos poliinstaurados pareceriam reduzir o risco de doença cardíaca, uma vez que muitos estudos NÃO têm demonstrado esse efeito.
(A peroxidação é uma reação química onde radicais livres - moléculas de oxigênio reativas - são incorporados na estrutura de uma gordura que compõe a membrana celular, levando a perda de sua estrutura).
O estresse oxidativo e peroxidação de lipídios são aspectos reconhecidos na promoção de doença cardíaca, câncer e outras doenças crônicas. O cozimento em alta temperaturas também pode oxidar carboidratos o que produz uma gama de produtos tóxicos de oxidação que promovem stress oxidativo, portanto diabete tipo II e doença cardiovascular. Os ácidos graxos poliinsaturados também sofrem de peroxidação pelo calor do cozimento.  Dessa forma, os métodos de  preparação e cozimento usados para alimentos que tradicionalmente são classificados com alimentos com gordura saturada podem produzir substâncias que promovem doenças a partir dos carboidratos e dos poliinsaturados presentes nesses alimentos. 
A alimentação humana tende a favor de alimentos com gordura e açúcar. De acordo com Lawrence, isso complica a correlação entre gordura saturada e doença. Os carboidratos mais simples facilmente sofrem oxidação, sendo que a frutose se oxida muito mais rápido que a glicose. Os produtos resultantes da oxidação incluem glioxal, metilglioxal (*), e formaldeído. O metilglioxal promove disfunção na camada interna das artérias, e está associado a hipertensão e aterosclerose em humanos. O formaldeído e o metilglioxal estão implicados na lesão no endotélio, estresse oxidativo e doença vascular (angiopatia).

O metilglioxal, (a forma aldeído do ácido pirúvico) é uma produto envolvido com a formação dos mal falados AGEs – produtos finais da glicação avançada. Quase sempre que falamos em glicação falamos da ação de carboidratos simples. A formação de AGEs é marcante em doenças como a diabetes, onde as taxas continuadamente altas de glicose no sangue estão implicadas nas complicações típicas da diabetes tardia com dano vascular: doença renal, problemas na retina, neuropatias etc.. 


Bem essa é primeira parte da súmula desse artigo. Está indexado no PubMed/Medline: basta procurar por Dietary fats and health: dietary recommendations in the context of scientific evidence

Nenhum comentário:

Postar um comentário