MICROBIOMA, SAÚDE INTESTINAL E ALERGIAS
(e porque não há uma alergia intestinal)
Título original publicado em 06/02/2020: Microbiome, Gut Health And Allergies, And Why There’s No Gut Allergy
O
que o leite, ovos, nozes, trigo, soja, peixe e marisco têm em comum? É
isso mesmo, eles causam alergias - na verdade, esses são os gatilhos mais
comuns de alergia alimentar na população, responsáveis por 90% das reações.
Esses alérgenos causam sintomas como espirros, coriza ou
nariz entupido, olhos vermelhos e lacrimejantes, urticária, inchaço, dor de
barriga, náusea e diarreia. Em casos graves, o corpo pode sofrer uma
reação extrema conhecida como choque anafilático ,
uma emergência médica que requer atenção imediata.
Nesse
artigo:
No
entanto, nem todos os alérgenos são alimentos - alguns podem ser
inalados. Pólen, mofo, ácaros, pelos de animais ou até fezes de baratas
podem desencadear asma alérgica ou rinite. A febre do feno é a rinite
alérgica que é desencadeada pelo pólen, especialmente na primavera.
A
asma atópica (extrínseca ou alérgica) é o tipo mais comum de asma. Faz com que os pacientes sintam
um quadro com falta de ar, chiado, tosse e uma sensação de aperto no
peito. A reação exagerada do sistema imunológico faz com que as vias
aéreas se comprimam e fiquem inundados com muco espesso, o que dificulta a
respiração.
Alergias
e intolerâncias são, na verdade, problemas médicos diferentes, porque são
causadas por diferentes caminhos nos processos do corpo. A intolerância
leva mais tempo para se manifestar, enquanto as alergias causam uma reação
rápida que às vezes pode ser mortal.
Alergias
Uma
alergia é caracterizada por uma reação imunológica sistêmica geral contra um
invasor do meio externo, em que as células imunológicas do corpo que combatem
doenças identificam erroneamente substâncias inofensivas como bactérias ou
vírus perigosos.
Essas
células imunológicas então 'atacam' o alérgeno, tentando eliminá-lo do
corpo. Eles produzem substâncias químicas chamadas anticorpos IgE
(imunoglobulinas-E) que se ligam ao alérgeno, causando a liberação de
histamina, responsável por muitos dos sintomas da alergia. Os sintomas de
uma alergia são:
- ·
espirros
- ·
coriza / nariz entupido
- ·
olhos lacrimejantes
- ·
inchaço
- ·
dor abdominal
- ·
náusea
- ·
diarreia
Embora
os sintomas alérgicos geralmente apareçam imediatamente, os sintomas de
intolerância podem levar até 20 horas para se manifestarem, à medida que os
alimentos se movem lentamente pelo sistema digestivo. E, diferentemente da
alergia, a intolerância nunca causa choque anafilático.
☝️As
alergias sazonais podem causar problemas estomacais? Náuseas
e diarreia são sintomas digestivos das alergias, mas também têm outras causas.
Intolerância
à lactose, álcool e glúten
Uma
intolerância alimentar, por outro lado, é quando o corpo não consegue digerir
os alimentos adequadamente, levando a sintomas digestivos como inchaço, cólicas,
constipação ou diarreia. Em alguns casos, eles podem causar reações graves
que requerem tratamento médico imediato.
Intolerância
à lactose e álcool
A
intolerância à lactose, por exemplo, é comum em até três quartos dos asiáticos
orientais. É causada pela redução na produção de uma enzima, uma proteína,
a lactase, que decompõe o dissacarídeo no leite conhecido
como lactose (também chamado de açúcar do leite). Quase
todas as crianças podem digerir o leite, mas essa proteína deixa de ser
produzida em muitas pessoas quando envelhecem.
Os
asiáticos do leste também costumam experimentar intolerância ao álcool, com um
característico 'rubor vermelho' e nariz entupido depois de beber álcool. A
cor vermelha vem do acúmulo de acetaldeído, um produto tóxico de decomposição
do álcool, devido à diminuição da produção de uma proteína que decompõe o
acetaldeído em uma substância menos tóxica.
Sensibilidade
ao glúten e doença celíaca
Problemas
na digestão do glúten são desencadeados pela exposição a muitos grãos, como
trigo, cevada e cuscuz. A doença celíaca é uma forma grave de intolerância
que requer que a pessoa afetada corte todos os alimentos que contenham glúten,
o que inclui alimentos muito comuns, como pão, cereais e macarrão. É
diferente da sensibilidade ao glúten não celíaca, um problema de saúde mais
leve que pode afetar 5% das pessoas.
Os doentes com doença celíaca experimentam inflamação auto-imune
no intestino delgado que é desencadeada pelo glúten, em que o sistema
imunológico ataca o próprio corpo, que, se não for tratado, pode levar a
condições que afetam outros sistemas do corpo, podendo levar a infertilidade, a
osteoporose (ossos quebradiços) e a fadiga crônica.
Curiosamente, 30% da população caucasiana e da Europa Ocidental
carrega um gene que predispõe à doença celíaca, mas apenas uma pequena
porcentagem das pessoas com esses genes desenvolve doença celíaca. Existem
exames como o desse LINK que busca
predisposições genéticas em relação à intolerância à lactose, álcool e glúten.
Saúde intestinal e alergias estão conectadas
Uma alergia pode ser
diagnosticada e tratada com medicamentos prescritos por um médico, mas existem
maneiras de evitar o risco de desenvolver alergias, começando com um intestino
saudável. O microbioma intestinal consiste no conjunto de bactérias que
vivem em nosso intestino em um relacionamento mutuamente benéfico conosco -
elas nos alimentam e nós as alimentamos.
Novas pesquisas estão
cada vez mais encontrando evidências de que um microbioma intestinal saudável e
diversificado está associado a menos sintomas alérgicos. As taxas de
alergias têm aumentado acentuadamente nas últimas décadas, à medida que os
humanos se instalam confortavelmente em ambientes urbanos.
De fato, os hábitos
alimentares tornaram-se mais padronizados e com menos variedade de fontes
alimentares. As pessoas ficam menos ao ar livre e fazem menos exercícios. As
famílias também estão tendo menos filhos e tomando mais antibióticos. Em
particular, os antibióticos são um potente distúrbio do equilíbrio microbiano
no intestino humano.
Todos
esses fatores fazem com que nossos microbiomas percam uma diversidade preciosa,
diminuindo o número de espécies no 'banco de dados' que nosso sistema
imunológico pode reconhecer como estranho, mas sem ter uma hiper reação, porque
sabe que não é prejudicial.
De
fato, essa ideia não é nova.
Já em
1989, a hipótese de higiene da alergia foi proposta, afirmando que
quanto maior a nossa exposição a microrganismos, menor o risco de desenvolver
alergias. Isso não se refere à frequência com que você arruma seu quarto
ou lava as mãos, mas a fatores que afetam seu nível de exposição a microrganismos.
Isso
ocorreu porque os humanos antigos, durante a evolução de nosso relacionamento
com os microrganismos, obtiveram muitos benefícios de
um relacionamento simbiótico com
espécies que existiam nos mesmos ambientes que as comunidades de
caçadores-coletores e agricultores, cercadas por lama e vegetação.
Isso
inclui os microrganismos que vivem em outras pessoas da comunidade, com as
quais nos acostumamos, e aqueles que nos infectaram em níveis subclínicos (sem
causar qualquer dano), os quais pudemos tolerar e aprender a construir defesas
imunológicas. Felizmente, existem algumas coisas simples que podem
aumentar sua exposição a eles, tais micróbios:
Ter
um ou mais irmãos mais velhos ↑
Morar
em uma zona rural em vez de zona urbana ↑
Ter
um animal de estimação ↑
Esses micróbios persistiram em nossos intestinos, formando uma parte
integrante do controle de nosso sistema imunológico contra agentes estranhos. Portanto,
os ambientes modernos, que comprometem sua existência, têm um efeito indireto
de comprometer nosso sistema imunológico, que reage exageradamente aos
alérgenos como se fossem esses micróbios antigos, colocando nossos corpos no
modo de defesa.
A
diversidade de microbiomas se desenvolve desde o nascimento
A diversidade de microbiomas se
desenvolve mais entre as idades de 0 a 3 anos, continua o desenvolvimento ao longo
da infância e se estabiliza na idade adulta.
Assim que o bebê
nasce, os microrganismos do ambiente começam a colonizar seu microbioma. De
fato, o parto vaginal demonstrou aumentar a diversidade de microbiomas em bebês
em comparação ao parto por cesariana, fornecendo proteção contra alergias mais
tarde na vida.
A amamentação também transmite diretamente bactérias
benéficas, como Lactobacilli e Bifidobacteria, para o bebê, e é rica em açúcares
conhecidos como oligossacarídeos que nutrem esses micróbios, o que, por sua
vez, fornece feedback ao sistema imunológico do bebê em desenvolvimento por
meio de sinais moleculares.
Embora muitas vezes
inevitável devido a infecções, o uso de antibióticos durante a gravidez e a
infância tem sido associado ao aumento do risco de alergias mais tarde na vida.
Probióticos e alergias alimentares
A boa notícia sobre alergias é que
às vezes as crianças as superam. Três quartos das crianças com alergias ao
leite ou aos ovos superam-nas até os 16 anos, e 20% das crianças com alergia
ao amendoim a superam. No entanto, há muitos recursos que os pais podem utilizar
para si e por seus filhos para diminuir o risco de desenvolver alergias em
primeiro lugar.
Pesquisadores em
Boston identificaram recentemente as espécies de bactérias intestinais, Clostridiales e Bacteroidetes ,
que protegem contra o desenvolvimento de alergias alimentares em crianças. Quando
esses micróbios foram dados aos ratos, aumentou a tolerância dos ratos a
alérgenos alimentares e reverteu suas alergias alimentares pré-existentes.
Os cientistas
especularam que, no futuro, dar essas bactérias a crianças cujos microbiomas
mostram sinais de formação de alergias poderia ajudar a impedir que essas
alergias se formassem em um primeiro momento. A sinalização desses bebês
já está sendo feita - em um estudo, crianças de três meses que não tiveram
quatro grupos principais de micróbios tinham maior probabilidade de desenvolver
asma aos três anos de idade.
☝️ FATO ☝️Não existe o melhor
probiótico para alergias alimentares, mas no futuro, pode
ser uma possibilidade graças à tecnologia de microbiomas e à pesquisa em
andamento.
Existe uma ligação entre probióticos e alergias
alimentares?
Prevenção, afinal, é
melhor que uma cura. Os métodos atuais visam desenvolver a tolerância de
um indivíduo, alimentando-o lentamente, aumentando quantidades de alérgenos
alimentares, mas isso consome tempo, exigindo que a pessoa se comprometa com um
longo curso de exposição consistente ao alérgeno - sem mencionar o risco de
efeitos colaterais.
Probióticos são bactérias vivas benéficas que podemos ingerir por via
oral, e prebióticos são
substâncias que alimentam diretamente as bactérias intestinais. Ambos
demonstraram aumentar a saúde intestinal. Um exemplo de prebióticos é a
fibra, que nutre bactérias em nosso intestino que produzem o butirato,
permitindo que eles mantenham o revestimento do intestino saudável e mantenham
uma comunidade simbiótica equilibrada.
Há evidências precoces de que os simbióticos,
que são uma combinação de pré e probióticos, protegem os microbiomas de bebês
predispostos à alergia ao leite de vaca. Mesmo que uma criança já tenha
alergia, os probióticos podem ajudar, com experimentos mostrando que eles
aumentaram a eficácia da imunoterapia oral em uma coorte de 62 crianças com
alergia ao amendoim.
FATO ☝️ Algumas pessoas podem
ser sensíveis aos probióticos,
principalmente se tiverem um sistema imunológico
muito fraco. No entanto, essas reações não são alergias alimentares
probióticas.
Como aliviar alergias sazonais e problemas
digestivos
Também foi demonstrado que o fornecimento de
probióticos orais em adultos com rinite - a obstrução nasal que geralmente é
causado por alergias sazonais – mostra auxilio com o Lactococcus lactis a protegendo
contra bactérias que causam pneumonia (uma infecção pulmonar grave), aumentando
a taxa de depuração desses micróbios patogênicos dos pulmões.
Uma dieta equilibrada e
diversificada, com muitas fibras e oligossacarídeos fornecidos durante a
gravidez, pode ajudar a proteger contra o desenvolvimento posterior de alergias
em bebês. Grãos integrais, feijões, vegetais, frutas, nozes e sementes são
todas fontes de fibras, incluindo fibras prebióticas que também beneficiam o
microbioma intestinal.
Por último, mas não menos importante, o exercício físico,
talvez a intervenção mais simples e menos complexa, provou aumentar a
diversidade de microbiomas. Nos modelos de camundongos, essa dieta
aumentou quantidades de bactérias benéficas, Lactobacillus e Clostridium leptum , que protegem contra a
alergia ao trigo. O exercício regular também está ligado à maior
diversidade microbiana intestinal, mais um excelente motivo para tornar a
atividade física parte de sua vida.
A
palavra final: é uma alergia intestinal?
Afinal, pode haver
mais sobre alergias do que imaginávamos saber até há pouco - e podemos fazer mais a respeito do que pensávamos ser possível anteriormente. Embora as
bactérias e alergias intestinais continuem sendo uma área ativa de pesquisa,
nutrição e dieta cuidadosas, juntamente com intervenções precoces, podem ajudar
as crianças a ficarem livres de alergias por toda a vida.
No entanto, mesmo que
exista uma conexão entre saúde intestinal e alergias, não há uma alergia
intestinal. Em vez disso, o intestino pode ajudar a mediar a reação do
corpo a um alérgeno. Dito isto, as intolerâncias alimentares ao glúten e à
lactose afetam diretamente o intestino, mas apresentam sintomas diferentes.