terça-feira, 4 de agosto de 2015

O que o pH ácido do estômago tem a informar



Credit: © dennisjacobsen / Fotolia
ACIDEZ ESTOMACAL E DIETA 

UM LINK EVOLUTIVO

Essa é a tradução de um artigo do Science Daily, de 29/07/15. Creio que vai parecer bastante inquietante. 

Uma análise dos dados sobre a acidez do estômago e a dieta de aves e mamíferos sugere que altos níveis de acidez estomacal foi desenvolvido para ajudar certos animais - não para decompor a comida, mas sim para defender esses animais contra intoxicação alimentar. Essa pesquisa levanta questões interessantes sobre a evolução da acidez do estômago em humanos, e como a vida moderna podem estar afetando tanto a nossa acidez gástrica como as comunidades microbianas que vivem em nossos intestinos.

DeAnna Beasley
"Nós começamos este projeto, porque queríamos entender melhor a relação entre a acidez do estômago, dieta e os micróbios que vivem nas vísceras de aves e mamíferos", diz DeAnna Beasley, uma pesquisadora de pós-doutorado na Universidade Estadual da Carolina do Norte e autor correspondente de um papel no trabalho. "Nossa ideia era que isso poderia oferecer algum contexto para examinar o papel do estômago humano na influência dos micróbios do intestino, e o que isso pode significar para a saúde humana."

A equipe de investigação - incluindo cientistas da Universidade de Washington e da Universidade do Colorado, Boulder - analisou toda a literatura existente sobre a acidez do estômago em aves e mamíferos, e encontrou dados em 68 espécies. A seguir eles coletaram os dados sobre os hábitos alimentares naturais de cada espécie. A partir disso os pesquisadores conduziram uma análise para ver como comportamento alimentar estaria relacionado com a acidez do estômago.

Os pesquisadores descobriram que os scavengers, ou espécies que se alimentam de comida com alto risco de contaminação microbiana, têm estômagos mais ácidos. Isto permite que a acidez do estômago atue como um filtro, o que controla efetivamente quais micróbios podem passar através do estômago para o intestino.

"A descoberta confirma a nossa hipótese, mas você tem que obter essa confirmação antes de avançar", diz Beasley. "O próximo passo para os cientistas será o examine dos ecossistemas microbianos nas vísceras destes animais para ver como estes ecossistemas têm evoluído. Os animais com elevada acidez do estômago têm populações menores ou menos diversificadas de micróbios do intestino? Ou será que eles simplesmente sediam micróbios que podem sobreviver em ambientes ácidos? "

Uma surpresa que emergiu é que, enquanto os pesquisadores classificam os seres humanos como omnívoros, os estômagos humanos têm os elevados níveis de acidez, normalmente associados com scavengers. Enquanto isso, a literatura mostra que os tratamentos médicos - sejam cirúrgicos ou o uso de antiácidos - podem alterar significativamente a acidez no estômago humano.

"Isto levanta questões importantes sobre a forma como os seres humanos evoluíram, a relação da nossa espécie com os alimentos ao longo do tempo, e como as mudanças na dieta e da medicina moderna estão afetando nossos estômagos, os nossos micróbios do intestino e - em última análise - a nossa saúde", diz Beasley. "Essas são perguntas da comunidade científica já estão explorando, e as respostas devem ser instigantes.”



(Scavenger - animais de rapina, se alimentam de carniça, animais mortos por outros animais caçadores, ou por outras causas, entre os mamíferos a hiena, o lobo da Tasmania etc., alguns caçadores típicos também podem se alimentar oportunisticamente dessa forma, os leões por exemplo.)


domingo, 19 de julho de 2015

Gordura saturada e a saúde do pulmão

Ácido palmítico no microscópio

GORDURA SATURADA E O PULMÃO
O surfactante e a saúde respiratória


O pulmão tem sua função primordial ancorada na ação de uma substância que cobre as membranas de brônquios e alvéolos: o surfactante pulmonar - ou simplesmente surfactante.
Sabe-se que há uma influencia exponencial da qualidade de lipídios alimentares em sua composição e subsequente eficiência.
Na busca por artigos que versam sobre o tema encontrei um bem interessante pois sua conclusão é a seguinte: 
"Concluímos que a prática comum de fornecer calorias na forma de ácidos graxos poliinsaturados para pacientes criticamente enfermos acarreta o risco de ser prejudicial para a função pulmonar.”
Isso foi concluído após submeter três grupos de porcos sob diferentes tipos de gordura alimentar - a base de saturada (ác. palmitico), ácido oleico e gordura de peixe. 
"A adesão foi reduzida nos grupos de ácido oleico e do óleo de peixe em comparação com o grupo do palmitato antes e depois da endotoxina. As alterações em conformidade com os suínos alimentados com ácido oleico e óleo de peixe foram consistentes com aumentos significativos no relação entre o peso pulmonar úmido/seco, aumento da retenção de  CO2, evidência histológica de congestão vascular, edema intra-alveolar e espessamento dos septos alveolares. Alterações na composição da fosfatidilcolina do surfactante entre grupos foram consistentes com a ideia de que o aumento de ácidos graxos insaturados pode afetar (negativamente) a função do surfactante."
(LINK)
Uma pesquisadora de um blog que também se ocupa de temas de saúde e alimentação apresenta o seguinte: "Aqui está mais um motivo para comer a abundância de gorduras saturadas. Dr. Donald Miller Jr., que é o professor de cirurgia na divisão cardio-torácica da Universidade de Washington, diz que o surfactante pulmonar é composto inteiramente, quando disponível, de um tipo especial de gordura saturada, o ácido palmítico de 16 carbonos. Se é adequadamente produzido com essa gordura, pode previnir a asma e outras doenças respiratórias. O recente aumento da asma poderia ter como causa a prevalência do uso de gorduras trans e dos óleos vegetais no lugar de boas gorduras saturadas. Quando consumimos gorduras parcialmente hidrogenadas, os ácidos graxos trans são assimiladas pelo surfactante pulmonar como um substituto para as gorduras saturadas que o corpo não está recebendo. Estas gorduras não naturais depositados no surfactante pulmonar pode significar que o surfactante é defeituoso e não é capaz de funcionar eficazmente causando asma “(LINK).
Uma referencia do grande pesquisador Ray Peat:
"A presença de palmito nos fosfolípidos do surfactante pulmonar [78] sugere que a sobrecarga materna de gorduras insaturadas podem interferir com a formação destas substâncias importantes, causando problemas respiratórios no recém-nascido". (LINK)
Alan Watson, outro pesquisador independente do ótimo “Diet Heart Publishing”, colocou um desafiador aspecto quando fala da importância do ácido palmítico: "Um detalhe do senso comum. Os franceses têm uma dieta rica em gordura saturada e baixas taxas de doenças cardíacas (ver estudo MONICA). Os franceses são fumantes pesados, mas têm taxas relativamente baixas de câncer de pulmão. Você não pode achar que o ácido palmítico - um ácido graxo básico e que representa (pelo menos) 68 por cento do surfactante pulmonar - seria um alimento de proteção para os franceses?”



Os medicamentos utilizados para transtornos respiratórios de recém nascidos (por exemplo: Survanta®) são produzidos à base de ácido palmítico, provavelmente porque proporciona um equilíbrio hidrófilo/lipófilo adequado para a preparação de PS (surfactante pulmonar para uso medicinal) LINK. Sobre esse tema temos outro estudo que confirma a melhor performance do surfactante (em terapêutica de neonatos) com o emprego de ácido palmítico nesse LINK.

As fontes alimentares mais abundantes desse ácido graxo saturado é a carne - gorda e eventualmente com pele, mesmo - além dos laticínios, e também da gordura do côco e dendê. O sebo bovino tem 30% de sua composição em ácido palmítico (fonte).  Bem mais que a banha de porco, que como muitos já sabem, é mais rica em ácidos graxos monoinsaturados (como o glamourizando óleo de oliva). 
Dessa forma parece ser bastante interessante estimular mulheres grávidas a comer uma boa quantidade de gordura saturada e manter-se a preocupação com o aleitamento materno (fonte importante de gorduras saturadas e colesterol para o nenê), ou nunca se substituir por imitadores alimentares de origem vegetal, a não ser que eles sejam artificialmente enriquecidos com esse ácido graxos de 16 carbonos.
Na verdade qualquer pessoa com problemas pulmonares poderá se beneficiar com o consumo de ácido palmítico. 
Ou melhor, todas as pessoas podem se beneficiar com o consumo de gordura saturada!


Observação:
Quem quiser um artigo bem detalhado sobre Surfactante e Saúde Pulmonar veja nesse link (European Respiratory Journal)



quarta-feira, 8 de julho de 2015

Longevidade comendo ovos e bacon

A mulher mais idosa do mundo com 116 anos tem uma  dieta com bacon e ovos 

(World's oldest person, 116, eats diet of bacon and eggs)



Mais duas longevas atribuem sua longa jornada a alimentos HI-FAT, como nossa brasileira em artigo publicado aqui no blog lipidofobia nesse LINK, no caso dela era a banha de porco. Esse é o tema de um artigo que saiu essa semana no jornal The Telegraph nessa última segunda-feira. 
Traduzi aqui o artigo:

Ela é uma das duas únicas pessoas no mundo que nasceram ainda nos anos 1800s - e justifica sua hábito de comer bacon e ovos todas as manhãs por mais de um século.
longevidade com o
Susannah Mushatt Jones, a pessoa mais velha do mundo, comemorou seu 116º aniversário na segunda-feira (06/7).
Na época de seu nascimento em 6 de julho de 1899, William McKinley era o presidente dos Estados Unidos, a guerra hispano-americana tinha terminado recentemente, e outros fatos do final do século XIX.
A senhorita Jones foi um dos 11 filhos de um pai que colheu algodão no Alabama. Após deixar a escola, ela se juntou a ele nos campos antes de ir para Nova York, onde ela trabalhava como babá nos “loucos” anos vinte.
Ela viveu duas guerras mundiais, revoluções tecnológicas, o movimento dos direitos civis, e a eleição do primeiro presidente negro dos Estados Unidos.
As últimas três décadas foram vividas em um complexo de acolhimento público para idosos no Brooklyn, Nova York, onde ela participou de patrulhas de segurança de inquilinos até ela chegar aos 106.
A senhorita Jones ficou cega há 15 anos, mas não está presa a uma cama e visita um médico apenas três vezes por ano.
A única medicação que toma é para a hipertensão arterial.
Todas as manhãs ela começa seu dia com um café da manhã com várias tiras de bacon, ovos mexidos, e milho moído.
Uma placa na parede da sua cozinha se lê "Bacon faz tudo melhor".
Perguntado sobre o que mais contribuiu para sua longa vida a senhorita Jones diz que ela nunca fumou ou bebeu, e "dorme bastante".
Senhorita Jones, que não tem filhos, passou seu aniversário com alguns de seus 100 sobrinhos e sobrinhas.
Lois Judge, uma das sobrinhas, atribuiu a longevidade de sua tia ao fato de ter crescido na região rural do Alabama, onde ela apanhava frutas e legumes frescos.
O Guinness World Records confirmou-a como a pessoa mais velha do mundo viva.
De acordo com o Los Angeles-based Gerontology Research Group, que mantém uma lista de "supercentenários" (mais de 110 anos), a única outra pessoa viva nascida no século XIX é Emma Morano, de Verbania (região do Piemonte), Itália, que é alguns meses mais jovem.
Ela é a mais velha pessoa viva da Europa e atribuiu sua longevidade a comer vários ovos crus por dia.

A pessoa mais velha que se tem notícia foi a francesa Jeanne Calment, que morreu aos 122 anos e 164 dias, de acordo com o Guinness World Records.



terça-feira, 23 de junho de 2015

A microbiota intestinal primordial e a saúde física e mental numa abordagem científica


Da alergia à saúde mental: a importância das pesquisas das bactérias intestinais

A discussão sobre as causas das enfermidades sempre foi um tema de fascinante debate no âmbito
das ciências biológicas.  Nos anos 80 uma médica inglesa promoveu uma reviravolta na abordagem do autismo, quando propôs o modelo da Síndrome Psicológica/Intestinal  (GAPS), para fornecer um novo tipo de compreensão clínico-terapêutica para situações tão distintas quanto esse drama neuro-psicológico (o autismo), asma e infeções infantis (como a otite). A dra. Natasha Campbell-McBride parecia ser ousada demais. (Podemos conhecer seu trabalho nesse LINK) Mas na verdade ela estava trazendo a tona, de modo prático, conhecimentos muito mais antigos, como veremos a seguir, em um trecho que selecionei de um conjunto de artigos publicados em março de 2015, no Jornal de Fisiologia Antropológica (Journal of Physiological Anthropology).  O titulo geral, dividido em três partes é: "Ambientes naturais, dietas ancestrais e ecologia microbiana: existira um 'distúrbio de deficiência-páleo' (paleo-deficit disorder)?" Muitos já devem estar sabendo que a base teórica que sustenta o campo low-carb, e todas suas matizes (paleo, keto, primal ou zero-carb, etc.) , é a perspectiva oferecida pela medicina evolucionista e por estudos de fisiologia baseado em antropologia. E a busca do equilíbrio da ecologia intestinal (antigamente chamado de flora, mas na verdade bactérias e fungos não são do reino vegetal, e sim de reinos próprios) é ambição primordial da prática nutricional que tem alvo de um amplo reequilíbrio de funções fisiológicas esquecidas ou sub-dimensionadas.
Nesse artigo é revisto de forma abrangente uma série de questões ligadas ao microbioma humano, numa visão ambiciosa à luz de um cenário ecológico mais requintado, 'menos verde' e mais full-color; com um vasto repertório de referencias bibliográficas.

Um dos pesquisadores chave é o famoso microbiologista René J. Dubos  (1901-1982). Ele foi um dos pioneiros da construção do arrojado paradigma Origens Desenvolvimentistas da Saúde e da Doença (ou DOHaD em inglês: Developmental Origins of Health and Disease ). Na década de 1960, ele realizou uma pesquisa inovadora sobre as maneiras em que as experiências mais precoces da vida com a nutrição, microbiota, estresse e outras variáveis ambientais poderiam influenciar os resultados de saúde tardiamente para um indivíduo. Ele reconheceu a relação co-evolutiva entre a microbiota e o o homem como hospedeiro. Quase duas décadas antes da hipótese da higiene, ele sugeriu que as crianças em nações desenvolvidas estavam se tornando muito higienizados (em comparação com nosso passado ancestral) e que os cientistas devem determinar se o ambiente de infância deve ser "sujado de uma forma controlada." Ele também argumentava que o celebrado gráfico de crescimento aumentado através de alterações na oferta global de alimentos e hábitos alimentares não deveriam ser equiparados a (uma expectativa de aumento da) qualidade de vida e saúde mental
René J. Dubos

HIGIENE, ALERGIA E SAÚDE MENTAL
(Ou simplesmente: limpeza demasiada faz mal, NT)

Em 1972, René J. Dubos (1901–1982) relatou que quando ratas isentas de agentes patogênicos específicos são alimentados com proteína de baixa qualidade durante o período perinatal, os conteúdos cerebrais de dopamina e norepinefrina na prole é diminuída [162]. Em 1986, Linda Hegstrand e seu colega R. Jean Hine relataram uma descoberta notável para a comunidade científica: em comparação com os animais livres de germes, animais alimentados convencionalmente têm maiores níveis de histamina no hipotálamo [163]. Embora mais conhecida por sua ligação com alergia, a histamina no cérebro em geral, e particularmente no hipotálamo, é um fator chave na excitação e no comportamento [164]. Talvez subvalorizado na época, esse trabalho foi um marco no eixo microbiota intestinal / cérebro.
Embora a própria hipótese da higiene manteve-se focada no reino da alergia, foi proposto em 2002,
que a forma como as bactérias benéficas influenciam as células T-helper (equilíbrio TH1/TH2) nas alergias também pode estender-se a condições em que os sintomas neuro-cognitivos são comuns. Quando esta proposta aparentemente estranha foi feita, (e aceita em agosto de 2002) assinalou-se que as alergias estão em uma sobreposição freqüente com condições crônicas onde tanto os sintomas emocionais como somáticos são características centrais. Se o desequilíbrio TH1/TH2 é um promotor de muitos dos sintomas emocionais e somáticos, é razoável considerar o papel atenuante de uma flora benéfica como teoricamente possível [89].

Como o foco tradicional para os micróbios nocivos começou a mudar em direção às bactérias comensais e promotoras de ácido láctico, uma inovadora perspectiva científica  começou a unir os sistemas imunitário / nervoso para a saúde neuro-psiquiátrica através dos micróbios não patogênicos e da nutrição. Embora no início dos anos 2000, essas discussões fossem colocadas à margem, longe da rede de segurança do frenesi iminente sobre o tema microbioma, Dubos não foi esquecido nas listas de referência [89], [165]. Ao longo da última década, os estudos clínicos e experimentais preliminares produziram resultados que teriam sido praticamente inconcebíveis até o final do século 20. Estranhamente, Dubos tem um número espantosamente baixo de citações (quando deveriam estar na marca de milhares de artigos - por exemplo, [162]) no Google Scholar.

A respeito dos seus próprios estudos inovadores sobre a microbiota do ambiente total, e o que isso pode significar para o bem estar humano, Dubos referiu a si mesmo como simplesmente seguindo os passos de Metchnikov [166]. Dentro de seu livro Man Adapting (Yale University Press, 1965), ele detalha suas próprias experiências sobre o transplante de microbiota fecal e imunidade. Ele descobriu que um ambiente mais higienizado reduzia a diversidade microbiana intestinal em camundongos. Neste texto notável, ele deixa claro que as diferenças de desenvolvimento evolutivo ancestral se refletem na presença ou ausência de membros dentro da microbiota indígena (original, primária) de várias espécies. Como de costume, ele demonstrou 
sua consciência de interação sócio-ecológico em humanos:

"Qualquer que seja o mecanismo exato da interação entre o estado nutricional e a microbiota do trato digestivo, é claro que a taxa de crescimento, necessidades nutricionais, e eficiência na utilização dos alimentos são influenciados por características […] das bactérias comensais Mas as práticas sanitárias e outros aspectos do estilo de vida pode também desempenhar um papel importante ao afetar a microflora primordial ... diferenças histológicas observadas na mucosa intestinal, dependendo do nível socioeconômico pode ser relevante para o problema, uma vez que provavelmente reflete a intensidade da resposta inflamatória da assim chamada - flora 'normal' ". [167].

Estudos usando ratos isentos de germes e agentes patogênicos mostraram definitivamente que os micróbios podem influenciar o cérebro e o comportamento [168], [169]. Em um dos estudos experimentais mais notáveis ​​até então, o transplante de microbiota fecal dos ratos doadores mantidos com uma dieta rica em gordura para ratos magros (que tinha sido mantidos com uma ração dietética   habitual) resultou em alterações de funções neurológicas. Especificamente, houve mudanças no comportamento sugestivos de ansiedade, aumento do comportamento estereotipado e diminuição da memória [170].

Estes estudos nos mostram que os micróbios interferem; no entanto, há limitações enormes quando se utiliza estudos com roedores, como um meio de fornecer modelos de transposição, para a saúde (humana) em geral, [171] e, especialmente, para questões complexas, como a saúde mental [172] - [174]. Até que ponto podemos considerar a relevância clínica de roedores sem germes e / ou em labirintos usados para medir a “ansiedade" desses roedores "vis-à-vis" ao equivalente complexo ecossistema humano? Animais no ambiente natural podem experimentar disbiose, mas eles não estão vivendo a vida livre de germes. Embora Dubos coloque o DOHaD no mapa com os seus próprios estudos com roedores isentos de germes  e agentes patogênicos, há 50 anos, ele quase certamente concordaria com uma nota crítica de que a (perspectiva comum da) saúde global mental/psiquiátrica não é neuro-ciência aplicada [175].

Este fato, uma perspectiva eventualmente inconveniente pode, às vezes, ser facilmente esquecido. Embora muitos produtos promissores num futuro próximo estarão sendo assinados com a inscrição "microbioma" (probióticos, estimulantes de flora, etc.), Dubos advertiu sobre a super-comercialização dos avanços tecnológicos semelhantes em seu tempo. Ele se referia a essas promoções (desses prováveis progressos possivelmente como 'produtos') em reuniões científicas como uma combinação de "desonestidade intelectual" e "escapismo intelectual" uma vez que eles ignoravam variáveis ​​ambientais mais amplas flagrantes que não seriam tão valiosas para  press-releases [176]. No mundo conectado contemporâneo de redes sociais pseudo-médicas [177], [178] e super propagandas de pesquisas por acadêmicos [179], aquelas preocupações podem ser particularmente relevantes.

Não obstante as dificuldades de transposição (para o âmbito humano), os estudos emergentes com roedores têm fornecido algumas pistas inegavelmente valiosas para possíveis vias mecanicistas de conexão dos micróbios (intestinais) com as funções encefálicas. Coletivamente, os estudos experimentais indicam que os micróbios benéficos podem influenciar a função cognitiva, o comportamento, e o estresse percebido por várias vias: uma comunicação direta ao sistema nervoso central (provavelmente através do nervo vago), controlando a barreira intestinal (com a limitação da inflamação sistêmica de baixo grau), a melhoria do estado nutricional (absorção fitoquímica e precursores de neurotransmissores), reduzindo o estresse oxidativo sistêmico, a regulação do controle da glicose, e a limitação da produção de toxina urêmica[180] - [183]. Sem dúvida, outros serão revelados.

No cenário clínico, vários estudos têm mostrado que os probióticos orais, ou alimentos / bebidas fermentadas, incluindo as bactérias benéficas, podem fornecer vantagens em expressões aparentes, tais como depressão, raiva, ansiedade e humor diário [184] - [189]. Talvez o estudo mais interessante até o momento, envolva as avaliações com ressonância magnética funcional (fMRI) antes e após o consumo por um mês de um alimento fermentado/microbiano vs. não fermentado, com os resultados de imagem sugerindo uma redução na vigilância aos estímulos ambientais negativos entre os adultos saudáveis que consumiram o produto lácteo fermentado [190]. A pesquisa também identificou diferenças na microbiota intestinal em pacientes com transtorno depressivo maior e fadiga crônica [191], [192]. Por outro lado, numerosos estudos mostram que os portadores de sintomas depressivos e altos níveis de sofrimento psíquico se envolvem em padrões alimentares que são muito distantes de um padrão tradicional saudável que poderia dar suporte a (adequada) diversidade microbiana [11].

Original - nome do artigo e autores:
Natural environments, ancestral diets, and microbial ecology: is there a modern “paleo-deficit disorder”? Part II

Alan C Logan1*, Martin A Katzman2 and Vicent Balanzá-Martínez3

fonte: http://www.jphysiolanthropol.com/content/34/1/9


As referências podem ser verificadas no artigo original.

O artigo original não tem gravuras



domingo, 21 de junho de 2015

A Academia de Nutricao apoia a gordura saturada




GORDURA SATURADA NÃO TEM RELAÇÃO COM DOENÇA CARDÍACA

Em fevereiro de 2015, como vimos no artigo sobre colesterol (LINK), uma luz iluminou as autoridades responsáveis em fornecer orientações dietéticas para a população americana. Agora é a vez da Academia (The Academy of Nutrition and Dietetics) fornecer seu parecer e suas recomendações sobre a gordura saturada, num ofício, talvez sem o apelo de palavras de ordem mais enérgicas, mas suficientemente enfático, em termos técnicos para pôr fim a qualquer preocupação com o consumo de gordura saturada, especialmente no que diz respeito à tradicional advertência sobre seus - falsos - efeitos promotores de doença cardíaca!
Veja o trecho sobre o tema de sua publicação (obs.: o jargão é técnico):



No admirável espírito da revisão de 2015 da DGAC (Dietary Guidelines Advisory Committee  -Comitê de Advertência paras Diretrizes Alimentares) de suas recomendações anteriores sobre a limitação do (consumo de) colesterol pela alimentação, a Academia (The Academy of Nutrition and Dietetics) sugere que o HHS (U.S. Department of Health and Human Services - departamento americano de saúde e serviços humanos) e o USDA (departamento americano de agricultura) apóiem uma revisão semelhante retirando a ênfase sobre a gordura saturada como um nutriente de preocupação. Enquanto o corpo de pesquisas que relacionam a ingestão de gordura saturada para a modulação da LDL e outras concentrações de lipo-proteínas circulantes seja significativo, esta prova é essencialmente irrelevante para a questão que relaciona dieta e o risco de doença cardiovascular. O relatório de 2010 do Institute of Medicine (IOM) sobre a utilização de biomarcadores LDL e HDL como representantes da evolução das doenças examinadas para estudos de caso concluiu inequivocamente que eles não eram adequados no emprego como marcadores do impacto da dieta sobre as doenças cardíacas. 38 O IOM concluiu que, "redução do LDL-C nem sempre se correlaciona com melhores resultados dos pacientes", 39 e descreveu a evidência do ensaio ILLUMINATE (em que uma terapia medicamentosa que evidenciou êxito na redução dos níveis de LDL-C e aumento de HDL-C, na realidade causou um aumento nos eventos cardiovasculares e morte).40 Devido a este e a demonstração de uma desconexão entre terapias de modulação de lipo-proteínas e as melhorias esperadas na evolução das doenças cardiovasculares de outros estudos, o IOM concluiu que "os dados suportam o emprego das taxas de LDL como um objetivo final para algumas terapêuticas  cardiovasculares  como a intervenção farmacológica das estatinas, mas não para toda e qualquer objetivo de terapia cardiovascular ou de outras intervenções cardiovasculares, alimentação, ou pelo uso suplementos“ e que “os dados atuais não suportam o emprego [do HDL] como um marcador final.“41  

O Documento da Posição da Academia sobre gorduras alimentares concluiu igualmente que, "apesar da documentada influência do (consumo de) gordura saturada sobre marcadores para doenças (cardiovasculares), o efeito da ingestão de gordura saturada na evolução dessas doenças não é clara." 42 Até mesmo o atual Relatório Científico do DCGA observa a incoerência da relação entre lipo-proteínas moduladas pela alimentação e os resultados cardiovasculares: "a maioria dos estudos que avaliaram a doença cardíaca coronária (CHD) ou a incidência de mortalidade também observou uma associação favorável entre a adesão a um padrão dietético saudável e o risco para CHD" 43 A implicação então, é que um certo número de estudos não observou a correlação esperada entre (os ditos) fatores de risco para CHD e incidência de CHD no contexto de padrões alimentares. A evidência é clara (no sentido de que) as mudanças nos níveis de LDL e HDL induzidos pela alimentação não podem ser comprovadas na correspondência com as mudanças previstas nos riscos reais para doença cardiovascular e, portanto, este corpo de evidências que usa as lipo-proteínas como parâmetros de marcação para a doença cardiovascular devem ser excluídos na consideração do impacto da dieta sobre a saúde cardiovascular.

Louvamos a DGAC em uma revisão completa e precisa da melhor evidência atual no que diz respeito ao corpo de provas relativas às gorduras alimentares na evolução das doenças cardiovasculares. No entanto, estamos preocupados pelo fato de que as provas não conduzem à conclusão de que as gorduras saturadas devem ser substituídos por gorduras poli-insaturadas para o maior benefício para a saúde.

O Relatório Científico discute as proeminentes meta-análises que consistentemente não têm encontrado nenhuma relação entre a ingestão de gordura saturada com o risco para doença cardiovascular, mas a interpretação destes resultados é ofuscada no relatório pela inclusão de suposições sobre os nutrientes de substituição não especificados (nas linhas 542- 546). Não há necessidade desses pressupostos para descrever completamente a relação entre grupos de macro-nutrientes e risco de doença cardiovascular usando a evidência presente nesta revisão. Se um grupo de macro-nutrientes exibe algum efeito real sobre o risco de doença cardiovascular, reconhecendo a limitação de que estes efeitos só podem ser observados no contexto da substituição entre os nutrientes, então os resultados entre os estudos de avaliação podem ser expressas com as seguintes desigualdades:



Na equação 1, uma redução na gordura saturada (Fsat) e aumento da gordura poli-insaturada (FPoly) resulta em uma redução do risco de doenças cardiovasculares; 44 e na equação 2, uma redução de gordura saturada com um aumento na ingestão de hidratos de carbono (C ) resulta em um aumento no risco. 45 A Equação 2 pode ser rearranjada para expressar os pesos relativos de gordura saturada e do hidrato de carbono no risco cardiovascular: 



A equação 3 demonstra que a ingestão de carboidratos representa uma quantidade maior de risco para doença cardiovascular do que a gordura saturada. Combinado com as provas de vários estudos que estimam o impacto de gordura saturada ser próximo de zero, 46, é provável que o impacto dos hidratos de carbono para o risco de doença cardiovascular seja positivo. Além disso, o impacto de gordura poli-insaturada pode ser adicionado ao (lado) negativo da equação 3 para comparar o impacto relativo para o risco de doença cardiovascular quando se faz a substituição da gordura poli-insaturada seja por gordura saturada ou com hidratos de carbono: 



C=Carboidrato


A equação 4 mostra que a substituição de carboidratos por gordura poli-insaturada irá resultar num menor risco líquido para a doença cardiovascular do que se a gordura poli-insaturada for substituída por gorduras saturadas. Isso é verdade porque os carboidratos contribuem para um  maior risco de doença cardiovascular do que a gordura saturada, de modo que a substituição dos carboidratos irá necessariamente resultar em uma melhora do risco. Portanto, parece que os elementos resumidos pela DGAC sugerem que a recomendação mais eficaz para a redução da doença cardiovascular seja a redução do  consumo de hidratos de carbono e sua substituição por gordura poli-insaturada. Esta recomendação simplificada também ajuda na criação de uma mensagem global consistente da DGAC, introduzindo uma mensagem ao consumidor para se concentrar nos benefícios de diminuir os açúcares adicionados na dieta para reduzir as doenças cardiovasculares, obesidade e diabetes tipo 2, o que é consistente com as declarações da conclusão da seção de açúcares adicionados nesse relatório científico.

O artigo se encontra em: LINK

Conheça a Academia de Nutrição e Dietética (USA)

(Obrigado a Eduardo R da Motta pela dica)

quarta-feira, 3 de junho de 2015

GMOS: Genes alterados, verdade distorcida



NOVO LIVRO SOBRE TRANSGÊNICOS

Quanto a aventura para os alimentos da engenharia genética tem subvertido a ciência, corrompido governos,  e sistematicamente enganado a população

Saiu no La Nacion (Costa Rica)

O advogado norte-americano Steven Druker escolheu a Costa Rica para apresentar o seu novo livro intitulado "Alteraed Genes, Twisted |Truth" (ou Genes Modificados, Verdade Distorcida) sobre a questão dos OGM, ou organismos geneticamente modificados.

O livro reúne 15 anos de pesquisa. Druker processou a Food and Drug Administration (FDA) - órgão de regulamentação de medicamentos e alimentos nos Estados Unidos, que teve de divulgar seus arquivos sobre alimentos geneticamente modificados (transgênicos).

"Esses arquivos revelaram que os alimentos alterados (derivados de transgênicos) obtiveram liberação para o mercado, em 1992, porque o FDA encobriu advertências de seus próprios cientistas sobre seus perigos, mentiu sobre os dados e depois violaram a lei federal de segurança alimentar, para permitir a comercialização, sem passar por padrões de testes de segurança", diz o comunicado divulgado por ocasião da apresentação.

Para Druker, a discussão sobre os OGM não tem sido clara e aberta, mesmo no seio da comunidade científica.

"Se tivesse sido, este livro não teria sido escrito", disse Druker, acrescentando: "Eu convido todos os costarriquenhos para se informar".

A antropologista, primatóloga e conservacionista Jane Goodall, descobriu que os organismos geneticamente modificados impactam o meio ambiente porque não se pode controlar a natureza e não evitar o contacto entre as populações selvagens e as modificadas, levando um efeito dominó sobre os ecossistemas.

Goodall escreveu o prefácio para Druker, e a Costa Rica é o segundo país onde este trabalho é apresentado, depois de Inglaterra.

Na terça-feira 24 de março uma segunda apresentação do livro foi realizada na Universidade de Costa Rica (UCR), que é transmitida através do link http://goo.gl/X4T0ko

Druker e Goodall vieram a Costa Rica, à convite da Fundação Pax Natura.

Steven Druker


Link da notícia: AQUI

Edição Kindle (Inglês)


quinta-feira, 21 de maio de 2015

Estudos com animais sobre o colesterol não provam nada

Fazer coelhos comerem gordura ou tigres comerem capim pode provar o quê exatamente?

Estudos que não provam nada

Essa é a tradução do capítulo cinco do livro Os Mitos do Colesterol do dr Uffe Ravnskov
Achei interessante publicar no blog pois ele traz a tona um aspecto curioso do aprendizado médico.

O texto a seguir é do famoso livro de fisiologia Guyton, 5a. edição que participou da formação de milhares de profissionais de saúde nas últimas décadas. (5ª edição brasileira, pg 815):

Produção Experimental de Aterosclerose em Animais



Mito 5


Estudos em Animais Provam a Ideia da Dieta-cardíaca

“Truques com coelho são sucessos positivos”.
 Harry Houdini mágico de origem húngaro-americana (1874-1926) 

Animais comendo a comida errada


Talvez o leitor esteja achando que a questão do colesterol no homem é um pouco complicada - e é. Mas não é nada comparado à situação no reino animal, embora, se isto o conforte, começarei dizendo que estudos do colesterol em animais não se aplicam aos humanos. 
Quando o tema é o colesterol, nenhum outro mamífero assemelha-se a nós. Eles têm outras taxas sanguíneas, têm hábitos dietéticos diferentes, e a maioria deles não se torna aterosclerótico. 
Muitos mamíferos nunca comem alimentos que contém colesterol. Se eles são forçados a uma alimentação rica em  colesterol, o nível de colesterol no sangue sobe a valores muitas vezes mais alto que o já visto em seres humanos normais. E uma vez que tais animais não podem utilizar este colesterol ingerido, cada órgão satura-se  de colesterol como uma esponja satura-se de água. 
Macaco Rhesus
Se os  animais só tão diferentes de nós, como nós podemos utilizá-los para  provar que comida rica em gordura e colesterol é perigosa para os seres humanos? Utilizando-se uma ração rica em colesterol, é possível induzir mudanças arteriais que vagamente se assemelham à aterosclerose humana em macacos rhesus, mas não é possível nos babuínos. Como nós vamos saber se o homem reage como um macaco rhesus ou como um babuíno ou como outro qualquer? 
Estas óbvias inconsistências nos estudos com animais não impediram que milhares de cientistas  inventassem numerosos modos para testar animais em laboratórios.
Porém, há muitas experiências e observações que podem nos dar elementos para o raciocínio. Vamos começar examinando a aterosclerose e a doença coronária em animais selvagens. Com o que se parece a aterosclerose nas artérias e corações de animais que vivem fora do laboratório? 
Aterosclerose semelhante à humana foi encontrada em muitos animais, mas seu aparecimento é menos difundido, provavelmente porque muitos animais selvagens sofrem mortes violentas ainda jovens e assim raramente alcançam a idade de aterosclerose. Um animal com aterosclerose pronunciada também pode ser uma presa fácil. 
A aterosclerose é encontrada  freqüentemente em pássaros, possivelmente porque a pressão sanguínea é mais alta que a de animais que não voam. Mas não é a gordura de origem animal ou o colesterol de suas dietas a causa disso. Pombos que comem sementes e  grãos, por exemplo, como os pingüins que vivem comendo peixes se tornam ateroscleróticos da mesma maneira que outras aves de rapina. 
Não há nenhum suporte para a ideia da dieta cardíaca (diet-heart) entre os quadrúpedes. A aterosclerose não têm sido observada em predadores, mas não é incomum entre os mamíferos vegetarianos devorados pelos primeiros. Leões-marinhos e focas também se tornam ateroscleróticos; obviamente não são auxiliados pela dieta baseada em peixe, que fornece mais gordura polinsaturada do que a maioria dos humanos consome.¹ 
Infelizmente, os investigadores em doença do coração não mostraram muito interesse na aterosclerose naturalmente presente nos animais. Para um cientista com uma  mente aberta, muitas questões pertinentes poderiam servir como trampolins para uma interessante pesquisa. Por exemplo, se mudanças vasculares semelhantes à aterosclerose humana é achada em alguns animais selvagens, mas não em outros. Por que estas mudanças acontecem nos herbívaros e nos animais marinhos e não naqueles que ingerem gordura animal? E seria possível prevenir ou tratar a aterosclerose espontânea dos animais? 
Ao invés, a maioria dos cientistas já decidiu que aterosclerose é o que aparece quando eles forçam coelhos em laboratório a se alimentarem com gordura e colesterol. 
Vamos dar uma olhada em alguns de seus resultados.
 

Coelhos e colesterol 

O coelho é um animal dócil e plácido. Não morde. Colher amostras de sangue de suas longas orelhas é fácil. E os coelhos são baratos. Mas a razão principal que tornou o coelho no animal mais comum nos laboratórios de colesterol é o modo que reagem a uma ração rica em colesterol. 
O coelho, obviamente, é um herbívoro. Se um coelho é forçado a comer um alimento que nunca comeria voluntariamente e que não pode digerir nem metabolizar, seu colesterol no sangue sobe a valores dez a vinte vezes mais elevados que os valores mais altos já alcançados em seres humanos. O colesterol se infiltra em todo o organismo do coelho; seu fígado e rins ficam gordurosos, seu pêlo cai e seus olhos se tornam amarelados pelo acúmulo de colesterol que não pode armazenar, não pode metabolizar  e nem pode excretar. Finalmente, morre, não por doença cardíaca, mas pela perda de apetite e desnutrição: morre de fome. 
É verdade que também é depositado colesterol nas artérias do coelho, mas estes depósitos nem mesmo remotamente se assemelham aos encontrados na aterosclerose humana. O colesterol aparece em diferentes lugares nos vasos sanguíneos dos coelhos em relação ao homem, e as mudanças microscópicas também são diferentes, sem qualquer hemorragia ou fissura tal como aparece no homem, e nenhum trombo ou formação de aneurisma é verificado nas paredes arteriais. O fato mais notável é que é impossível induzir um ataque de coração em um coelho através de meios dietéticos. O único resultado que a ingestão de colesterol que o coelho compartilha com homem é aumento do  conteúdo de colesterol na parede arterial. 
Outras espécies superalimentadas com colesterol e gordura de animal produzem resultados variados. As características das mudanças patológicas são semelhantes a essas do coelho, mas a quantia e o local do colesterol nas paredes arteriais variam. Como uma regra, é extremamente difícil provocar um ataque de coração em animais através de manipulação dietética. Para ter êxito, o cientista precisa combinar dieta com qualquer outra coisa, como injeções de hormônios ou promovendo um dano mecânico nas artérias.² 
Em raros experimentos ataques cardíacos foram observados em animais de laboratório alimentados com colesterol e gordura animal. Mas isso não é prova alguma de que a comida seja a causa, porque aterosclerose e doença coronária de coração acontecem em animais de jardins zoológicos alimentados com suas dietas naturais. Para provar que a alimentação não natural cause um ataque cardíaco, deveriam ser estudados dois grupos de animais de laboratório, um grupo recebendo comida de rica em gordura e um outro recebendo sua comida natural. 

Corações em greve de fome

Quem faz experimentos em animais freqüentemente se esquecem que os animais não gostam disto. Este fato é crucial para estudos de doença coronariana, uma vez  que frustração e a tensão psicológica são consideradas possíveis causa da doença. Neste contexto pode ser interessante olhar para algumas experiências executadas pelo médico americano e cientista Dr. Bruce Taylor e seus colegas de trabalho. (Este é o mesmo Dr. Taylor que nós discutimos no Capítulo 1.) Os proponentes de dieta cardíaca citam freqüentemente estas experiências como prova de que a gordura animal provoca aterosclerose e doença cardíaca em humanos. 
Dr. Taylor e sua equipe estudaram macacos rhesus selvagens capturados da selva. Para produzir "aterosclerose", eles forneceram uma ração acrescida de quantias enormes de colesterol. Ao longo da experiência, os macacos foram internados individualmente em pequenas gaiolas para cachorro, uma manobra que eles obviamente não gostaram. Para prevenir uma fuga, as gaiolas foram reforçadas com folhas de metal. 
Os macacos apreciaram a comida ainda menos do que seus alojamentos. Eles comiam pouco e lançavam o resto ao redor das gaiolas. Por longos períodos eles ficavam em greve de fome. 
Obter amostras de sangue destes infelizes macacos era  difícil para todos os envolvidos. Para adquirir sangue suficiente, era puncionada a artéria da virilha do macaco, ao que os  macacos resistiam violentamente  - eles gritavam, urinavam e defecavam.³ 
De 27 macacos, um teve um ataque de coração depois que fosse sujeitado a quatro anos de experimentação neste laboratório de porão em Chicago. De forma interessante, os cientistas informaram que este animal era especialmente hiperativo e extremamente nervoso.4 
Eles fizeram o relato deste fato, mas não o desenvolveram. Talvez fatores distintos das altas taxas  de colesterol no sangue poderiam ter causado o ataque de coração neste animal inteligente isolado durante anos em uma gaiola pequena, alimentado com uma dieta de  gosto ruim e regularmente sujeitado a terríveis coletas de amostras de sangue. Não seria possível? Nós não sabemos. Taylor e os seus colegas, e a maioria dos outros que citaram este estudo em artigos  posteriores, consideraram como causa a comida e os níveis altos de colesterol, nada mais. 
Nessas experiências, o colesterol dos macacos escalou a valores tão altos quanto nunca medidos em seres humanos. Mas não foram os níveis de colesterol que determinaram o resultado. Este fato foi demonstrado em uma interessante experiência do Dr.Dieter Kramsch e colegas no Departamento de Pesquisa  Clínica do Instituto Cardiovascular Evans, em Boston. 
Dr. Kramsch e sua equipe estudaram tantos macacos quanto Dr. Taylor o fez, mas o projeto do Dr. Kramsch os separou em três grupos. Um grupo recebeu ração natural para macacos, e os dois outros receberam ração com manteiga somada a colesterol. O grupo alimentado com a ração normal e um dos grupos alimentados com a ração enriquecida ficaram inativos em suas gaiolas, ao longo da experiência. Ao terceiro grupo foi permitido exercitar. 
Só os macacos inativos alimentados com manteiga e colesterol contraíram aterosclerose coronária e doença de cardíaca. Mas os macacos que tinham liberdade para se exercitar tinham as artérias coronárias amplas, quase lisas, embora o colesterol fosse quase tão alto quanto dos macacos inativos!5
Infelizmente, Dr. Kramsch e seu grupo não informaram o que aconteceu com os macacos inativos alimentados com a ração normal. 
Isto seria o mais curioso, porque se estes macacos não desenvolveram aterosclerose, significaria  que é a combinação de inatividade e comida de rica em gordura que produz aterosclerose. E se estes macacos inativos com ração normal tivessem desenvolvido aterosclerose da mesma maneira que os macacos inativos com ração rica em gordura, a inatividade, e  não a alimentação gordurosa, é a culpada. Ambas as alternativas forneceriam uma informação muito interessante. Será que os resultados do estudo foram tão controversos que os investigadores não ousaram informar? Nós não sabemos. 


Os proponentes honestos da ideia da dieta cardíaca admitem que sua  hipótese não será provada criando aterosclerose e doença cardíaca em animais, mas estudando estes problemas em seres humanos. E eles imaginam que serão bem sucedidos em provar isto. No próximo capítulo veremos se eles têm razão.