sábado, 25 de dezembro de 2021

Vacinas e autismo - uma história fraudulenta


Em setembro de 2020 o jornalista investigativo Brian Deer lançou um livro onde relata toda a pesquisa que realizou para desmacarar a conduta desonesta do medico inglês Andrew Wakefield, habitual referência da horda antivacina. Se trata de um profissiona que teve um artigo publicado na prestigiosa revista médica inglesa The Lancet onde relacionava a vacina triplice viral (MMR) e o autismo. Mas ele foi conduzido por interesses não relatados, pago por um escritório de advocacia que invocaria esse estudo como suporte técnico à demanda contra o fabricante da MMR. Andrew no inicio nem era de fato um "antivacina", pois tinha registrado uma patente para vacina isolda contra o sarampo. A investigação de Deer deu um fim a história (pseudo)"científica" de Wakefield, seu artigo foi retratado pela The Lancet, e ele foi banido da profissão. Infelizmente o seu legado ficou. E, como em outras situações semelhantes, suas declarações originais ainda são repetidas, sem que seus repetidores tenham o cuidado de investigar o background de uma questão tão delicada.  
Sim, a relação vacina x autismo é última análise uma Fake News.
No texto a seguir segue uma entevista onde Deer fala sobre sobre a história do livro para uma rádio da Nova Zelândia (NZR), que traduzimos para os seguidores do site lipidofobia.

Brian Deer - falsidades sobre as vacinas e suas repercussões

 

(Artigo de Jesse Mulligan)

Andrew Wakefield relacionou falsamente a vacina MMR com o autismo há 22 anos e as repercussões ainda são sentidas hoje.

O jornalista Brian Deer investiga o escândalo desde 2003. Seu novo livro se chama The Doctor Who Fooled the World.

Banido da medicina, graças às descobertas de Deer, Wakefield fugiu para os Estados Unidos e agora está atuante no movimento anti-vacina dos EUA.

Wakefield era um pesquisador desconhecido na década de 1990 investigando para uma possível ligação entre o sarampo e a doença de Crohn, disse Deer a Jesse Mulligan.

Essa ideia não foi muito longe, já que o sarampo estava diminuindo por causa da vacinação e, no entanto, a doença de Crohn estava aumentando.

“Então, ele mudou para vacinas contra o sarampo e começou a argumentar que a vacina contra o sarampo causava a doença de Crohn.”

Wakefield foi então abordado por um escritório de advogados.

“Eles o convidaram a passar da doença intestinal, que era seu interesse, para danos cerebrais que eram o interesse deles.”

Eles queriam iniciar uma ação judicial contra os fabricantes da vacina tríplice viral (sarampo, caxumba rubéola) alegando que causava autismo.

“Eles o convidaram para se tornar essencialmente um funcionário e ele começou a pesquisar para este escritório de advocacia para argumentar que a vacina tríplice viral causasse o autismo”, diz Deer.

Isso culminou em um artigo de pesquisa publicado na revista médica britânica The Lancet em 1998.

O jornal dizia respeito a um grupo de 12 crianças levadas para uma clínica de problemas intestinais no Reino Unido.

“Ele fez alegações sobre crianças cujos pais as levaram a uma clínica intestinal em um hospital e disse que esses pais lhe transmitiram a informação de que seus filhos estavam perfeitamente normais, haviam recebido a vacina tríplice viral e, 14 dias depois, estavam mostrando os primeiros sinais de autismo”, diz Deer.

Deer estava determinado a investigar a pesquisa em 2003 e entrevistou uma mãe de uma das crianças do estudo.

“Perguntei a ela em grande detalhamento o que aconteceu com seu filho e a história que ela me contou simplesmente não poderia ser associada com nada contido no artigo de Wakefield na Lancet.

“E essa discrepância me instigou a procurar uma explicação sobre o que estava acontecendo.”

Ele então descobriu o relacionamento “oportuno” de Wakefield com o grupo de advogados.

“Foi muito propício, de fato, ele foi mantido dois anos antes do artigo ser publicado no The Lancet, ele havia sido contratado por este escritório de advogados, ele concordou em trabalhar para eles por uma quantia muito substancial de dinheiro”.

“Ele estava recebendo taxas por horas de trabalho para apresentar um caso contra a vacina tríplice viral para começar uma ação judicial.”

Esse relacionamento nunca havia sido relatado antes, diz ele.

“Ele nunca contou ao The Lancet sobre isso, eles não sabiam nada sobre isso, seus coautores não sabiam que ele tinha esse acordo.”

Investigar mais a pesquisa de Wakefield foi como descascar as camadas de uma cebola, diz Deer.

“Ele também registrou uma patente oito meses antes do lançamento desse artigo sobre sua própria vacina contra o sarampo isolada."

“Ele estava argumentando publicamente que os pais deveriam recusar a vacina contra sarampo, caxumba e rubéola 3 em 1 e pedir vacinas separadas.”

Mais tarde, Deer descobriu que Wakefield alterou as histórias, sintomas e diagnósticos das crianças contidas em seu artigo para criar a aparência de uma nova síndrome, permitindo que o escritório de advocacia, que lhe remunerou, levasse adiante o litígio.

Essa ação coletiva foi lançada em outubro de 1998 e durou até 2003, quando entrou em colapso a um custo final de ambos os lados de US$ 100 milhões, diz ele.

Mas o dano foi feito e o temor sobre a tríplice viral continua até hoje.

Sua pesquisa agora está totalmente desacreditada, The Lancet retirou o artigo e Wakefield pode não praticar mais medicina no Reino Unido, mas Deer continua preocupado com a integridade da pesquisa publicada em geral.

“Isso pode estar acontecendo aqui, agora e em qualquer lugar por causa da maneira como a pesquisa científica anônima é apresentada."

“Os periódicos e os especialistas falam sobre revisão por pares, que é um sistema extremamente falho.”

“As pessoas pensam que uma revisão por pares é um teste de verdade, mas não é, é apenas um teste de plausibilidade superficial.”

Wakefield nunca se desculpou ou invalidou sua desacreditada pesquisa.

“Ele simplesmente não conseguiu, simplesmente não estava em sua natureza, ele simplesmente é incapaz de reconhecer que, se você está fazendo o que ele fez, em primeiro lugar, foi um profundo conflito de interesses e esse conflito de interesses o levou a cruzar uma linha a ponto de os editores do BMJ comentassem em minha investigação descrevendo como uma fraude.”

Agora Wakefield é um ativista anti-vacina em tempo integral.

“Ele é muito mais um dos motores atuais deste movimento anti-vacina e tudo começou em uma mentira.”


Artigo original

Tardes com Jesse Mulligan, (08/09/ 2020)

Do site da RNZ - Rádio Nova Zelândia

Link do original AQUI 

Foto de uso livre AQUI


O livro de Brian Deer, ainda sem tradução em português

Outro artigo em português sobre o tema, mas antes da publicação do livro (LINK AQUI)