domingo, 4 de dezembro de 2022

Quando pedir um exame de vitamina A



Uma breve discussão sobre a solicitação de exames de vitamina:
Vitamina A (retinol)


 Muitas pessoas podem ficar interessadas em dosar vitaminas no sangue, e uma dessas, que muitas vezes é alvo de preocupação é a vitamina A. Vamos fazer algumas considerações baseadas em artigo de revisão baseado em pesquisa e investigação.

Em primeiro lugar é importante ter em mente que a deficiência da vitamina A é incomum. Entretanto, se houver algum dos sintomas como, olhos secos, dificuldade visual a noite ou frequentes enfermidades, fazer esse exame de sangue pode ser indicado e eventualmente detectar, com segurança, uma deficiência da vitamina A. 

Precisamos também lembrar que os níveis séricos dessa vitamina permanecem normais nos exames até que ocorra uma grave deficiência. Por isso, tal avaliação é geralmente desnecessária, salvo se numa avaliação (médica) parecem existir indicadores positivos para relacionar à carência de retinol.

Uma vez que é geralmente desnecessário essa investigação não deve ser considerada como exame de check-up rotineiro, pois:

  • A deficiência de vitamina A é rara em países desenvolvidos.
  • A menos que você já esteja com deficiência grave, um teste de laboratório de vitamina A sérica provavelmente não fornecerá uma imagem precisa do seu status de vitamina A porque testa os níveis no sangue, não no fígado. 50%-85% de sua vitamina A é armazenada no fígado. Os níveis séricos de vitamina A em pessoas saudáveis ​​permanecem bastante constantes até que as reservas hepáticas sejam severamente esgotadas [ 1 , 2 ].

 

Vamos examinar a seguir um pouco mais sobre os sintomas, fatores de interferência, fontes naturais e opções de suplementação.

A dosagem de vitamina no sangue é um exame confiável quando criteriosamente solicitado. Um estudo mostrou seu valor quando a deficiência está associada ao olho seco (xerolftalmia) e acompanhando sua evolução com uso de suplementos.

O exame de retinol sérico é realizado em laboratório pelo menos por duas metodologias (cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC) e espectrofotometria). O este padrão ouro seria por biópsia hepática, mas pelo óbvio de sua complexidade só é realizado em circunstâncias muito específicas.

Taxas de exame de vitamina A (sangue)

                                                                   Valor de Referência:

– 0 a 6 anos.: 0,11 a 0,65 mg/L
– 7 a 12 anos: 0,13 a 0,81 mg/L
– 13 a 17 anos: 0,14 a 0,98 mg/L
– Idade igual ou superior a 18 anos: 0,32 a 0,78 mg/L

– A organização mundial da saúde recomenda suplementação quando os níveis de vitamina A estão abaixo de 0,2 mg/L (ou 20mcg/dL).
– Níveis de vitamina abaixo de 0,1 mg/L indicam deficiência severa.
– Níveis de vitamina A superiores a 1,2 mg/L indicam hiper vitaminose e toxicidade associada.
 

FONTES DE VITAMINA A

A vitamina A refere-se a um grupo de compostos. As formas de vitamina A incluem retinol, ácido retinóico, retinal e carotenóides pró-vitamina A. A vitamina A é importante para a função imunológica adequada, crescimento e reparo celular, crescimento ósseo, reprodução e desenvolvimento embrionário e fetal normal. Porém a história mostra que a vitamina é excepcionalmente importante para a visão. Relatos de que a cegueira noturna era curada com o fígado cozido de boi pelo doutor naval Eduard Schwartz (1831-62), comprovam por experimento científico, que essa fonte básica de vitamina A tratava um problema dramático de marinheiros europeus no século XIX. Em várias culturas anteriores era dada importância ao fígado de animais como alimento sagrado de proteção aos olhos.

A vitamina A foi “descoberta” como o fator que existia em alimentos gordurosos de origem animal em 1907, pelo pesquisador americano Elmer V McCollum, que inicialmente denominou de fator lipossolúvel A.

Tem sido informado que podemos obter vitamina A a partir de fontes vegetais, como alimentos de cores vermelhas ou alaranjadas (como o tomate e cenoura), uma vez que a pré-vitamina A (carotenos como o betacarotenos, o mais eficiente) pode ser transformada no intestino para a vitamina A ativa. Alguns estudos mostram que a eficiência dessa transformação é bastante trabalhosa para o organismo, numa relação otimista de 4:1 (betacaroteno/retinol). Como depende de ácidos biliares, dietas pobres em gordura interferem nessa conversão. Deve-se ressaltar que nenês não conseguem converter em qualquer hipótese e que crianças pequenas o fazem de modo precário. Por isso, por algumas décadas era comum se adicionar o óleo de fígado de bacalhau como suplemento alimentar popular para crianças, mas de importância infelizmente esquecida nos tempos atuais.

Assim podemos falar que as principais fontes de vitamina A “prontas” são as gorduras de origem animal, incluindo obviamente o leite materno, fígado, ovos, laticínios integrais especialmente a manteiga, um suplemento à base de óleo de fígado de bacalhau.

O betacaroteno, um precursor da vitamina A como já descrito anteriormente, é um pigmento carotenoide natural e que está presente em alimentos vegetais como os folhosos verde escuros, e em especial nos legumes e frutas marcadamente coloridos (por exemplo urucum, beterraba, cúrcuma, caqui etc.). Seu excesso na ingestão promove uma mudança na coloração na pele que as vezes é confundida com a icterícia.

A vitamina A está presente suplementar como aditivo comum em uma variedade de alimentos industrializados. Habitualmente está adicionado em produtos artificialmente fortalecidos como o leite de amêndoas e outros substitutos lácteos, incluindo todas as fórmulas para lactentes.

Para adultos a vitamina A está disponível em inúmeros suplementos polivitamínicos, além de produtos farmacêuticos com vitamina A principal ou exclusiva. As quantidades são geralmente seguras, mas uma dose maior precisa de supervisão médica.

QUEM ESTÁ EM RISCO DE DEFICIÊNCIA DE VITAMINA A

Como já foi citado a deficiência de vitamina A é considerada rara em países desenvolvidos, mas pesquisadores em um estudo de pacientes de cirurgia bariátrica (perda de peso) relataram essa deficiência vitamínica em até 69% em um grupo de estudo (essa cirurgia para redução de peso pode ter como consequência um prejuízo na absorção de nutrientes). Outras populações de risco incluem:

1) Prematuros

2) Lactentes com mães com deficiência de vitamina A

3) Individuos com quadros de má absorção nutricional: celíacos, doença de Chron, problemas de pâncreas com carências de enzimas digestivas, síndrome do intestino curto (má absorção); 

4) Alcoólatras;

5) Pessoas com esteatose:

6) Indivíduos com dietas com muita pouca gordura;

7) Aqueles com desnutrição ou ingestão inadequada de nutrientes em populações tipicamente sob risco alimentar, associada a pobreza, refugiados e outras comunidades em carência crônica.

8) Diabéticos e pacientes com hipotireoidismo podem não se beneficiar com fontes de beta-caroteno pois tem pouca eficiência na conversão.

Quais são os sinais e sintomas de deficiência de vitamina A ?


Sabe-se que a deficiência de vitamina A causa xeroftalmia, uma forma de olho seco que afeta a retina e a córnea, causando baixa visão com pouca luz ou cegueira. Mas a baixa vitamina A também pode prejudicar a função do sistema imunológico. Sinais e sintomas comuns incluem:

  • Infecções recorrentes e má função do sistema imunológico
  • Olhos secos
  • Cegueira noturna
  • Manchas de Bitot (acúmulo de proteína no olho) 
  • Pele seca e escamosa
  • O revestimento dos pulmões, do intestino e do trato urinário engrossa e endurece.

Sinais e sintomas menos conhecidos podem incluir:

  • Sono ruim 
  • Ciclo circadiano alterado
  • Pedras nos rins
  • Asma
  • Alergias
  • Intolerâncias alimentares
  • Hormônios sexuais baixos
  • Doença autoimune
Uma deficiência grave de vitamina A pode levar à cegueira, mas isso é extremamente raro. A relação da vitamina A presente em fontes alimentares pode ter relação com procedimentos rituais ou aparentemente mágicos de recuperação da cegueira em tempos antigos, pois a adição de porções de animais sobre os olhos e posteriormente ingeridos fazia a mágica do cego que voltava a enxergar. (Há muito tempo se sabe que ingerir olhos de animais recuperariam a visão, naturalmente na época que não se conhecia a vitamina A).

Para indivíduos que possam estar apresentando sinais e sintomas de deficiência de vitamina A e/ou estiverem em alto risco, geralmente é seguro suplementar com uma dose modesta de vitamina A mesmo sem fazer exames de sangue. Naturalmente nesse caso seria prudente buscar uma consulta médica.

CONSIDERAÇÕES FINAIS:

Muitas vezes as pessoas são induzidas a fazerem exames de sangue com propósitos imprecisos, ou por mera curiosidade. Se não existem sintomas ou quadros clínicos associados à essa carência inusual, não precisa ser solicitada a dosagem de vitamina A em pedidos de exames ordinários ou checkups anuais.

As dosagens de vitaminas costumam fazer parte de solicitações extensas, mas com propósito discutível. O pedido de vitamina A pode estar incluído nesse equivocado, e inutilmente dispendioso, inventário clínico que provavelmente não vai trazer nenhuma vantagem para o indivíduo (para diagnóstico ou tratamento) ou para a coletividade que paga despesas inúteis num sistema público ou privado, que pode ter seus custos aumentados por não se seguir um pensamento minimamente técnico na solicitação de exames.

 

(*) Esse texto é uma compilação baseada nos artigos dos links abaixo. As referências científicas constam dentro dos artigos originais.

1) Do you need a vitamina A test? - de Michael Ruscio LINK AQUI

2) Vitamin A saga - site da WAPF - Sally Fallon e Mary Enig LINK AQUI 

3) Valores de referncia da vitamina A em laboratório (Palma Mello)  LINK AQUI 

4) Informações adicionais da deficiencia de vitamina A - Manual MSD LINK AQUI             

 

 


quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

O que se sabe sobre as aftas

 


AINDA NÃO SABEMOS O QUE  FUNDAMENTALMENTE CAUSA AS AFTAS

Mas provavelmente é culpa do sistema imunológico.

Uma afta — uma úlcera branca e dolorosa dentro da boca — pode ser causada pelo estresse. Ou a pasta de dente errada. Ou certos alimentos: tomate, amendoim, canela. Ou uma deficiência de ferro. Ou uma alergia. Ou uma nova medicação prescrita. Ou uma doença autoimune subjacente.

Embora milhões de pessoas sofram com elas todos os anos, os pesquisadores ainda não sabem muito sobre o que basicamente causa essas feridas. Isso deixa médicos e dentistas travados, brincando de detetive com seus pacientes - executando uma lista de verificação, tentando descobrir qual dos mais de uma dúzia de gatilhos em potencial poderia ter desencadeado as pequenas lesões doloridas.

Essa lista é longa e abrange diferentes especialidades da medicina. Inclui trauma na boca, estresse, dieta, genética, hormônios, alergias, deficiências de vitaminas, doenças autoimunes e doenças gastrointestinais. Diana V. Messadi, professora da Escola de Odontologia da UCLA, relata que as aftas são multifatoriais, o que as torna difíceis de estudar. O herpes labial, em comparação, oferece uma história muito mais clara: são infecções virais (herpes simples) e, portanto, são tratáveis ​​com antivirais. (As lesões do herpes são bolhas semelhantes a espinhas que geralmente se formam ao redor dos lábios, enquanto as aftas são úlceras brancas que ocorrem dentro da boca.)

As aftas podem ser frouxamente classificadas em dois baldes. No Balde A estão as feridas menores e mais comuns, do tipo que uma pessoa pode ter duas ou três vezes por ano. Essas feridas são brilhantes, incômodas e dolorosas e dificultam a alimentação e a fala. Eles geralmente não são fatais. No Balde B estão cancros maiores, geralmente com mais de um centímetro de largura. (Tecnicamente, existe um terceiro balde que inclui feridas herpetiformes ou agrupadas - mas esse tipo é raro).

Grandes ou pequenas, algumas feridas estão ligadas a uma doença subjacente, como Crohn, Behçet, HIV/AIDS ou doença celíaca. De certa forma, esses casos são mais bem compreendidos: as feridas são um efeito secundário de algo mais acontecendo no corpo – algo que um médico pode testar e identificar.

A boca humana é um lugar estranho. As aftas ocorrem no que é chamado de mucosa oral, que é a linguagem médica para a pele (na verdade não é pele) dentro da boca. Mesmo que a mucosa esteja escondida dentro de suas bochechas, ela fica muito exposta. A salsa, observa Nasim Fazel, ex-professor da UC Davis que iniciou a clínica de mucosa oral da faculdade, “é um irritante químico. Você não esfrega salsa na sua pele.” Mas as pessoas comem salsa - e batatas fritas, nozes e outros alimentos condimentados, ácidos ou picantes e que podem danificar o revestimento da boca. Algumas dessas feridas mais tarde se desenvolvem em aftas.

Como a boca está suja, os glóbulos brancos gostam de ficar ali; Andrés Pinto, professor da Faculdade de Medicina Dentária da Case Western Reserve University, disse que desta forma podem reagir rapidamente a uma potencial infeção. Mas, às vezes, esse sistema de vigilância falha e o corpo pode se automutilar. Acredita-se que isso faça parte do que causa as aftas típicas, explicou Pinto: a desregulação imunológica é o “denominador comum” por trás dessas úlceras. A inflamação pode ajudar o corpo a cicatrizar, mas muita inflamação pode causar a ruptura da mucosa, que é o que vemos quando olhamos para as feridas ovais.

Além disso, as aftas ainda são idiopáticas, o que significa que os médicos realmente não sabem por que elas acontecem. O sistema imunológico do corpo é profundamente complicado; como Ed Yong escreveu em 2020, é onde “ a intuição vai morrer ”. “O problema com todas essas condições imunomediadas, muitas vezes, é que ainda não sabemos por que elas surgem”, informa Alessandro Villa, chefe de medicina oral do Miami Cancer Institute. “No final das contas, ainda é um grande mistério.”

Outro mistério persistente é por que algumas pessoas têm aftas enquanto outras vivem em êxtase ignorante, livres de seu tipo específico de tortura. A genética está começando a ajudar a resolver isso. “Usando computadores sofisticados, podemos realmente detectar quais genes estão associados ao que vemos na boca”, diz o pesquisador Pinto. “O que acabei de dizer é um grande passo”, acrescentou. “Demorou provavelmente 30 anos para desenvolver essa última frase.”

Mais pesquisas são necessárias para tratar melhor os pacientes, especialmente aqueles com feridas graves ou crônicas. Os esteróides tópicos podem ajudar, mas não abordam as causas subjacentes. Um porta-voz do FDA afirmou que não há opções disponíveis de prescrição aprovadas pelo FDA especificamente para aftas.

Comparativamente falando, os Estados Unidos não têm muitos provedores especializados nessa área. A dra. Fazel, antiga professora da UC Davis, é uma rara combinação de dentista e dermatologista que às vezes atende pacientes com casos debilitantes. “Estou usando os mesmos remédios que usava há 10 anos”, disse ela. “É meio triste.”

Os especialistas em medicina oral são dentistas com treinamento extra em tais doenças. Mas apenas cerca de 400 praticam nos Estados Unidos, estima Andres Pinto. Um representante da Academia Americana de Medicina Oral relata que a organização atualmente tem 281 membros ativos (embora tenha notado que pode haver outros não membros praticando). Fazel, por sua vez, acha que os dermatologistas estão mais bem equipados para tratar aftas, porque os dentistas “não podem prescrever as grandes armas”. (As “grandes armas”, neste caso, são medicamentos que modulam o sistema imunológico para acalmar a inflamação.) Mesmo que um paciente consiga consultar o médico certo, esse é apenas o primeiro passo. Eles ainda precisarão passar pela "check-list", tentando determinar quais são seus gatilhos - enquanto a questão maior sobre o que realmente causa as feridas permanece desconhecida.

Caroline Mimbs Nyce é redatora da equipe do The Atlantic.
Publicado em 26/11/2022 - THE ATLANTIC
Link do original: AQUI
A foto acima é desse LINK